PEDRO CRISÓSTOMO (http://www.publico.pt/autor/pedro-Crisóstomo)
02/01/2014 - 08:02
Maria Luis Albuquerque
e Paulo Portas em Dezembro, na apresentação das conclusões da 10.a
avaliação NUNO FERREIRA SANTOS
Portugal
chega à recta final do empréstimo, mas pode ser forçado a uma segunda volta. No
início deste ano, faz um novo teste aos mercados. O custo do financiamento é
uma variável decisiva, embora não a única, para determinar qual o “programa”
que se segue.
Com tranquilidade.
Assim espera o Governo percorrer a recta final do resgate financeiro acordado em
2011 com a União Europeia (UE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI). O
vice-primeiro-ministro, Paulo Portas, pôs o relógio em contagem decrescente.
Mas, a menos de meio ano de terminar o empréstimo de 78 mil milhões de euros, a
percepção de risco dos mercados sobre a economia portuguesa e a sua capacidade
de financiamento, embora tenha diminuído, não desapareceu.
O
executivo pode dizer, grosso modo, que cumpriu e que quis ir «mais longe» no «programa
de assistência» - que Pedro Passos Coelho considera, agora, ter sido «mal
calibrado». E é isso suficiente para Portugal controlar qual é a porta de saída
do resgate?
Este
é o último ano em que o empréstimo da UE e do FMI representa a principal fonte
de financiamento líquido do Estado. E as condições em que o Tesouro tentar
no início
deste ano obter dívida com prazos de reembolso mais longos
no mercado de obrigações poderão ser determinantes para clarificar a solução do
pós-memorando da troika.
Portugal
tem já 15.700 milhões de euros de financiamento assegurado para este ano (7800
milhões do empréstimo da troika e outros 7900 milhões em saldo de
tesouraria). Em falta, e já depois de concluir uma operação de troca de dívida
que permitiu empurrar para mais tarde o reembolso dos títulos, tem ainda 7100
milhões, segundo o montante estimado pela agência responsável pela gestão da
dívida pública (IGCP) numa apresentação feita junto de investidores em meados
de Dezembro.
Para
testar o apetite do mercado, o Governo quer chegar ao fim do actual resgate já
com as necessidades de financiamento de 2014 asseguradas. Embora o montante que
o Governo ainda precisa de financiar seja quase tanto como o valor que ainda
vai receber do empréstimo da troika, só uma parte desses 7.100 milhões
terão de ser levantados no mercado primário, através de emissões de dívida.
Isto porque no Orçamento do Estado para 2014 o executivo prevê conseguir 2500
milhões de euros em Certificados de Aforro e do Tesouro.
Se,
oficialmente, o Governo ainda admite numa ‘saída limpa’ (sem um novo empréstimo
ou um mecanismo de seguro), o presidente do BCE já assumiu, publicamente, que o
país precisará de um qualquer “programa”. Em Dezembro, quando falava em
Bruxelas no Parlamento Europeu, reduziu a dois os cenários que o executivo
colocava na mesma altura em cima da mesa. Mas a ambiguidade da expressão «programa»
deixa tudo em aberto: a possibilidade de Portugal negociar com os parceiros europeus
um novo “programa” de resgate, com as condicionalidades de um empréstimo
posterior ao actual, ou um “programa” cautelar, uma espécie de linha de crédito
de precaução, também com condicionalidades e supervisão europeia.
Se a seu favor joga o
facto de a Europa não querer que Portugal seja uma nova Grécia, com um novo
resgate, a pressão dos mercados ainda é bem visível nas taxas de juro
praticadas no mercado secundário (acima dos 6%), colocando pedras no caminho do
acesso pleno ao financiamento de mercado. Os mercados estão atentos à garantia
do Governo de que cumprirá em 2014
a meta do défice de 4%. À melhoria de alguns indicadores
económicos num ano em que o executivo espera um ligeiro crescimento e uma
estabilização do consumo. Mas olham também para a estrutura da economia e para
o elevado desemprego. E é neste contexto que, a 27 de Janeiro, a avaliação da
situação portuguesa deverá estar em cima da mesa da reunião do Eurogrupo, em
Bruxelas.
Vigilância
apertada
Candidatando-se a um
“programa cautelar” - um cenário que o governador do Banco de Portugal, já
referiu em Março de 2013 - o acesso ao mercado é feito com a rectaguarda do
Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) e do BCE. Por um lado, Portugal pode
receber uma garantia deste fundo de socorro para superar perturbações de
financiamento e, ao mesmo tempo, beneficiar da activação do programa de compra
de dívida do banco central no mercado secundário, destinado a reduzir a pressão
dos especuladores e a baixar os juros da dívida (os valores aqui praticados são
um indicador importante para perceber a tendência dos juros quando o Tesouro
vai ao mercado primário levantar fundos).
Mesmo
terminando as avaliações trimestrais da missão externa, certo é que no “pós-troika’’
a vigilância europeia e do FMI vai continuar, seja qual for a saída do actual
resgate. A Irlanda, que dispensou um programa cautelar, vai continuar sob
acompanhamento do FMI e da UE.
Quando
apresentou as conclusões da décima avaliação da troika, a ministra das
Finanças, Maria Luís Albuquerque, dizia que a estratégia de regresso aos
mercados faz parte da “conclusão do programa independentemente da estratégia” a
adoptar no pós- troika. As duas questões estão umbilicalmente ligadas. Para
assegurar as suas necessidades de financiamento, seja para pagar o reembolso de
empréstimos já contraídos, seja para fazer face a novos défices, Portugal terá
de começar a ir ao mercado primário levantar fundos, emitindo obrigações do
Tesouro. No caso de conseguir prescindir de um segundo empréstimo externo,
Portugal terá fazê-lo com regularidade, dada a dimensão do volume de dinheiro
de que precisa.
Portugal
começa a reembolsar os empréstimos da troika já em 2015 e só termina a
amortização dessa dívida em 2042, saldando o envelope financeiro garantido pela
União Europeia através dos seus fundos de socorro - MEEF e FEEF - e pelo FMI.
Ao todo - e segundo uma simulação do IGCP considerando já a extensão em sete
anos do prazo dos empréstimos europeus garantidos pelo MEEF -, a República tem
de reembolsar 72,29 mil milhões de euros. A isso soma-se a amortização
correspondente à fatia do empréstimo que ainda será entregue até ao fim do
programa de resgate. Mais de metade do valor a reembolsar tem de ser pago
dentro de dez anos. Isto num total de reembolsos que chegam aos 167 milhões de
euros.
Numa
análise recente, o FMI estimou as necessidades de financiamento bruto de
Portugal entre 2013 e 2015 em 65,9% do PIB anual, quando para a Irlanda essa
estimativa está nos 30,5%.
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