ISABEL ARRIAGA E CUNHA (http://www.publico.pt/autor/isabel-arriaga-e-cunha) 15/12/2013
17:36
A Irlanda é o primeiro país dos cinco países sob assistência
financeira externa a livrar-se do programa de ajustamento
Dublin
forneceu à zona euro a história de sucesso que os seus Governos esperavam para
poderem provar que a austeridade
imposta aos países financeiramente mais frágeis
constitui a estratégia adequada para lhes permitir voltar a caminhar
"pelos próprios pés".
A Irlanda
é o primeiro dos cinco países sob assistência financeira externa a livrar-se do
programa de ajustamento económico e financeiro
associado, mesmo se o seu orçamento continuará sob a vigilância das
instituições europeias até 2042, o ano previsto para o fim
do reembolso da totalidade dos empréstimos de 67.500
milhões de euros recebidos da zona euro e do Fundo Monetário Internacional (FMI).
"A
conclusão bem sucedida do programa irlandês é um sinal forte de que a nossa
resposta comum para a crise está a dar resultados” e
prova que "um programa de ajustamento tem um princípio e um fim, e que o caminho entre
estes dois pontos é mais suave quando há uma
aplicação determinada por parte do pais em causa, como foio o caso da Irlanda, afirmou
esta semana Olli Rehn, comissário europeu
responsável pelos assuntos O Governo irlandês viu-se forçado há três anos a pedir a ajuda dos
parceiros da zona euro e do FMI para enfrentar uma grave crise bancária
provocada pela implosão, em 2007, de uma gigantesca bolha imobiliária
alimentada pelo enriquecimento — meteórico nacional: de um dos países mais
pobres da União Europeia (UE) no início dos anos 1990, a Irlanda tornou-se em 27 anos no segundo mais rico, a seguir ao
Luxemburgo, atingindo em 2007 um PIB por habitante de 41.000 euros, equivalente a 146% da média comunitária.
A título de comparação, o PIB português era nesse ano de 15.100 euros por habitante, ou 79% da média
europeia, e o da Alemanha 39.000 euros, ou 116% do conjunto dos então 27
membros da UE.
Para evitar o colapso do sistema bancário, que representava então mais
de oito vezes o valor do PIB, Dublin decidiu em 2008 injectar montantes astronómicos nos bancos para
os salvar, abrindo um rombo nas finanças públicas, que passaram de uma situação
equilibrada para um défice de 32% do PIB e arredando o país do mercado da dívida.
O pedido de ajuda foi encarado como uma profunda humilhação nacional, de
tal forma que o Irish Times se interrogou então em editorial "se
foi para isto que os homens de 1916 morreram: um resgate da chanceler alemã com
alguns shillings de simpatia do primeiro-ministro britânico".
"Depois de termos obtido a nossa independência política da Grã-Bretanha para sermos os donos dos nossos assuntos, cedemos agora a nossa soberania à Comissão
Europeia, ao Banco Central Europeu e ao Fundo Monetário Europeu", lamentou
o jornal, referindo-se
às três instituições da
chamada troika de credores.
A cólera popular manifestou-se de imediato nas eleições legislativas que se
seguiram à aprovação da ajuda, com uma razia imposta ao Fianna Fail (centro-esquerda), o partido dominante
quase sem interrupção durante mais de 80 anos.
Apesar disso, foi a equipa do Fianna Fail
que, bem antes do pedido de ajuda, desenhou o essencial do programa de
ajustamento, cujos termos foram aceites quase sem alterações pela troika.
Talvez por isso as metas orçamentais irlandesas foram consideradas bem mais
realistas do que as dos programas português e grego, de tal forma que não
geraram surpresas nem derrapagens.
A diferença mais surpreendente entre os três países é,
no entanto, a falta de contestação popular à dura austeridade imposta à
população e que se traduziu num ajustamento orçamental desde 2008 a rondar os
20% do PIB e reduções de salários entre 15 e 18% para recuperar
competitividade.
"As pessoas sentem-se um bocado embaraçadas
e responsáveis pela bolha imobiliária", explica Suzanne Lynch,
correspondente do IrishTimes em Bruxelas. "Também não há, na
Irlanda, a ideia de que é o Estado que tem de se ocupar de nós. E os salários
eram tão altos que toda a gente reconheceu que tinha de haver uma correcção”.
Segundo a jornalista, "a haver cólera, é contra os bancos, mas o sentimento
dominante é sobretudo cansaço e preocupação, porque muita gente não consegue
pagar os empréstimos imobiliários". Em causa está o desemprego, que
permanece superior a 12% da população activa - apesar da emigração massiva
desde o início da crise - a par da queda para metade do valor das casas.
Apesar do sucesso celebrado pela zona euro do programa
irlandês, a sua conclusão oficial hoje está longe de representar o fim dos
problemas nacionais.
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