NUNO SÁ LOURENÇO – 08/01/2014 – 13:34
Presidente
do júri que escolheu empresa privada, ouvido esta manhã no Parlamento,
confirmou e sustentou opção de não utilizar regras do código da contratação
pública
A audição
parlamentar ao presidente do júri que decidiu a subconcessão das infra-estruturas
dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
resultou esta quarta-feira num debate jurídico-administrativo entre a maioria e
a oposição.
De um
lado o PSD e o CDS - junto com o procurador-geral adjunto
do júri - a sustentar que todos os procedimentos legais a ter em conta tinha
sido observados. Do outro, o PS, PCP e BE a levantarem dúvidas sobre o facto de
não terem sido observadas as regras definidas pelo código de contratação
pública. Com a comissão parlamentar de Defesa a encerrar os trabalhos ouvindo a
deputada do BE a ameaçar com uma queixa à Procuradoria-Geral da República e a
do PCP a sustentar a necessidade de um inquérito parlamentar à decisão de
subconcessão.
A questão
foi desde logo suscitada pelo PSD, através da deputada Mónica Ferro, que pediu
a João Cabral Tavares que se pronunciasse sobre se o processo exigia que se
observassem as regras de um concurso público.
O procurador-geral
adjunto foi logo mais longe ao reconhecer que para lá das regras
do concurso público -
imparcialidade, transparência e concorrência - se
ponderou a validade de seguir as regras do código de contratação pública. Que,
concluiu, não se aplicavam por não se estar “nem de perto, nem de longe,
perante serviços que coubesse ao Estado prestar”, lembrando o facto dos
Estaleiros terem como missão a construção naval.
Esse
argumento foi contestado pela oposição, embora o PS, PCP e BE tenham
inicialmente centrado numa outra revelação de Cabral Tavares. A de que existia
um parecer que sustentava essa posição da não necessidade de recorrer ao
código. “Este parecer quem é que o solicitou”, perguntou o
socialista Jorge Fão. “Quando foi solicitado”, acrescentou Carla Cruz do PCP.
“Não teve necessidade de pedir outro parecer”, insistiu a bloquista Mariana
Aiveca.
Subjacente
às perguntas estavam uma ideia partilhada pela oposição que não resumiu na pergunta a Cabral Tavares em que o confrontou
com o facto de estar a ser “tutelado” na sua decisão. Suspeitas sustentadas
ainda pelo facto do júri ter sido apoiado por uma “assessoria jurídica e uma
assessoria financeira” que aparentemente não se sabia por quem tinham sido
nomeadas - o escritório BBR e a BESI- e por um membro do gabinete do ministro
da Defesa.
As respostas de Cabral
Tavares não ajudaram ao esclarecimento
O procurador-geral adjunto, apesar de insistentemente questionado
sobre estes temas, teimou em não responder. Sobre o parecer adiantou apenas que
já existia - pelo menos a sua síntese - ainda antes do júri ter sido formado.
Foi só depois do presidente da comissão parlamentar de Defesa o ter questionado
sobre de quem era a autoria que Cabral Tavares acrescentou não se recordar.
Também não esclareceu quem e quando havia sido solicitado. Sobre as assessorias
deu a entender que poderia ser as equipas que estavam a assessorar o anterior
processo de privatização e que
estavam ali - incluindo
o assessor do ministro - para “recolher [e prestar] toda a informação
necessária”.
A audição
acabou por transformar-se num
pingue-pongue sobre a necessidade ou não de se recorrer ao código de contratação
pública. Com Cabral Tavares a insistir que não tinha “dúvidas” de que “não se
aplicava”, recorrendo ao argumento que não estavam em causa serviços ou obras
públicas que fossem da responsabilidade do Estado. Que o que estava em causa
era uma “licença” e não uma “concessão”.
Oposição não ficou convencida
O socialista
Marcos Perestrello criticou a aparente “informalidade” que tinham presidido ao
processo, reconhecendo não perceber sequer qual fora o “enquadramento jurídico que presidira ao procedimento”. Carla Cruz conclui
que se “adensavam as dúvidas” sobre a decisão, o que justificava o inquérito
parlamentar - que o PCP propôs. E Mariana Aiveca considerou que “só restava
fazer a aferição do Ministério Público”.
Foi então
que o presidente da comissão parlamentar, Matos Correia, invocou a sua condição
de jurista para fazer uma contestação categórica a estas considerações e até
mesmo dar a entender a falta de “seriedade intelectual” por parte da oposição.
Dizendo que o recurso ao código “não afectaria em nada o acto e a natureza do
concurso”.
O que ficou por
responder foi a pergunta deixada no ar por Marcos Perestrelo, momentos antes.
“Quer dizer, para comprarem porcas e parafusos os Estaleiros de Viana tinham de
seguir o código de contratação pública, mas para ceder a sua actividade e
encerrar as portas já não se aplicou...”
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