RAQUEL ALMEIDA CORREIA 10/01/2014-07:33
Apesar do aumento de 26% nos contactos, a
associação abriu menos 1400 processos de acompanhamento porque muitos dos casos
já não são recuperáveis. Principal preocupação para 2014 são os reformados.
Surgem
cada vez mais no limite, sem oxigénio financeiro para voltar a respirar. Muitos
vivem sozinhos e apenas do seu rendimento, tendo por vezes a cargo menores de
idade. No ano passado, a Deco recebeu 29 mil pedidos de ajuda de famílias em
dificuldades financeiras, o que significou um aumento de 26% face a 2012. No
entanto, o número de processos de acompanhamento abertos pela associação caiu
drasticamente. É que, em muitos casos, já não há recuperação possível.
Dados
cedidos ao PÚBLICO pela Deco mostram que, entre Janeiro e Dezembro de 2013,
29.214 pessoas contactaram a associação para resolver desequilíbrios
financeiros que continuam a ser motivados, em grande parte, por situações de
desemprego. A perda de emprego foi mencionada como causa das dificuldades por
32% das famílias. Seguem-se os cortes salariais, com 30,6%, e a doença (8,1%).
O rastilho tem-se mantido
praticamente o mesmo nos últimos anos, mas voltou a registar-se uma subida
substancial nos pedidos de auxílio, já que em 2012 houve 23.183 contactos. Face
a 2010, o número praticamente triplicou.
Natália
Nunes, coordenadora do Gabinete de Apoio ao Sobreendividado (GAS) explicou que
este novo acréscimo no ano passado se deve ao facto de “as famílias terem visto
a sua situação financeira agravada, fruto do aumento do desemprego e dos cortes
salariais”. O agravamento foi de tal forma que “muitas das situações que
surgiram já não tinham margem para recuperação”. E, por isso, o número de
processos de acompanhamento abertos pela Deco em 2013 desceu face ao ano
anterior.
Entre
Janeiro e Dezembro, foram criados 4034 processos, quase menos 1400 do que em
2012. A associação só acompanha famílias que ainda se encontrem numa situação
de dificuldades financeiras passível de ser invertida. Não trata, por exemplo,
de casos em que existem já processos de execução ou de insolvência, nem
interfere na renegociação de dívidas de natureza fiscal. Muitos dos casos que
lhe bateram à porta poderiam não ter seguido ainda a via judicial, mas “estavam
já num limite de inviabilidade da recuperação”, referiu Natália Nunes.
A
coordenadora do GAS acrescentou que muitos desses casos são protagonizados por
famílias monoparentais, em que apenas uma pessoa contribui para o orçamento.
“Até 2012, pediam ajuda maioritariamente famílias compostas por três elementos,
em que havia um casal a suportar os encargos. Agora, em 30% dos casos há apenas um elemento no agregado, que é
solteiro ou divorciado”, explicou. Nestas situações, a almofada financeira é
muito mais curta, o que precipita os desequilíbrios e também impede, por vezes,
a recuperação.
Em termos de
dispersão geográfica, o Porto liderou em 2013 o número de pedidos de ajuda à
Deco, representando 27,8% do total e ultrapassando Lisboa, que surge em
segundo, com uma incidência de 24,4%. Natália Nunes afirmou que tal alteração
se ficou a dever ao facto de “o aumento da taxa de desemprego ter sido mais
expressivo na região Norte”, já que a ausência de trabalho continua a ser
principal causa para as dificuldades financeiras.
Mas houve
outra mudança importante em 2013: nos processos abertos pela associação, a
grande maioria das famílias já estava em incumprimento, enquanto no ano
anterior 54% tinha os créditos regularizados. Em 23% dos casos, havia
prestações em mora há mais de seis meses e, em média, cada processo tinha
associado cinco empréstimos. De entre os créditos habitualmente contraídos, o
pessoal continua a destacar-se, com uma média de 1,7 por família. Nos cartões,
a incidência é de 1,4 créditos e, na habitação, de 0,8.
Quando
contactam a Deco, estão sobretudo interessados em pedir ajuda na reestruturação destes contratos - um objectivo que é comum a
73% dos processos. Outros 14% pretendem reestruturar o incumprimento, seguindo-se 8% que querem negociar um período de carência
do pagamento das prestações.
Do perfil
traçado pela associação, conclui-se que 38% das pessoas com dificuldades financeiras acompanhadas pelo GAS
têm rendimentos mensais entre 485 e 950 euros, sendo que a taxa média de
esforço mensal com despesas subiu de 96 para 98% em 2013. A maioria está casada
e 40% tem entre 40 e 54 anos. Há uma fatia mais expressiva de 36% que trabalha
no sector privado, tendo 35% o segundo ou terceiro ciclos de ensino.
Para 2014, a
principal preocupação da Deco são os reformados, que têm sido um dos alvos das
medidas de austeridade, como a que foi clarificada quinta-feira pelo Governo,
que significará a aplicação da Contribuição Extraordinária de Solidariedade
(CES) sobre as pensões acima dos mil euros brutos mensais. “Além
dos cortes a que já estão sujeitos, são muitas vezes estas pessoas que assumem
os encargos dos filhos e dos netos e, por isso, estão a ser duplamente
penalizados”, explicou Natália Nunes.
A
coordenadora do GAS afirmou que “apesar de a taxa de desemprego estar a cair,
continua em níveis muito elevados”, considerando que “este ano deverá haver uma
nova subida” nos pedidos de ajuda. Outra franja da população que continuará a
contribuir para esse aumento são “os desempregados com mais de 40 anos, que
terão muita dificuldade em voltar ao mercado de trabalho”. Os próximos meses
serão de “ainda maiores desequilíbrios nas finanças pessoais”, acredita.
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