Passos Coelho diz que os quadros de Miró “terão de
regressar a Portugal para que uma future exportação aconteça” sem ilegalidades
Passos Coelho diz que a venda
se mantém, Seguro pede recuo, Presidente da República não comenta a polémica
SILVIA CANECO
silvia.caneco@ionline.pt
CATARINA FALCÃO
catarina.falcão@ionline.pt
A Christie’s propõe avançar para o leilão dos 85 quadros de Joan Miró
que pertenceram ao BPN em Junho, na condição de que a Parvalorem se comprometa
a não responsabilizar a leiloeira ou exigir-lhe qualquer indemnização devido ao cancelamento do leilão que estava agendado para esta terça e
quarta-feira, em Londres. O i sabe que os advogados da Christie’s enviaram uma minuta de acordo aos representantes da Parvalorem e da
Parups ainda na terça-feira à noite, mas que este acordo ainda não foi sequer
discutido pelos proprietários do espólio, já que dois administradores da
Parvalorem se tinham deslocado para Londres.
O contrato assinado entre a
sociedade anónima encarregada de gerir os activos tóxicos do BPN e a Christie’s previa que a Parvalorem teria de pagar uma indemnização de cerca de 5 milhões de euros à leiloeira caso a venda do espólio não
se concretizasse. Acontece que o entendimento dos representantes da Parvalorem
é outro: quem terá incumprido o contrato terá sido a leiloeira. Isto porque o
modelo de contrato escolhido era um modelo “chave na mão” e responsabilizava a Christie’s por todas as operações anteriores ao leilão. Em troca de uma margem de
lucro maior na venda dos quadros, caberia à leiloeira “requerer e obter todas
as licenças e autorizações necessárias para dar exequibilidade zelosa e cabal
a todos os serviços contratados, nomeadamente, no que diz respeito à
exportação para venda, embalagem, recolha, transporte, depósito, exposição,
leilão, venda e entrega das obras de arte ao respectivo comprador”.
Assim sendo, ao que o i
averiguou, os representantes da Parvalorem entendem não serem os responsáveis
pela ausência de autorização para a saída das obras do país - já que o contrato
previa que seria a Christie’s a tratar de “obter todas as licenças e
autorizações” - nem por o leilão não se ter realizado, já que, às 10h de
quarta-feira, o Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa já se tinha
decidido pela não suspensão.
Apesar de a juíza que
decidiu sobre o decretamento provisório da providência cautelar ter entendido
que aquela colecção ainda podia ser classificada como património cultural, a verdade é que a
Lei de Bases do Património Cultural português já não deixa essa margem de manobra. O artigo 68.º
determina que essa classificação de interesse nacional está vedada nos dez anos
seguintes ao da importação ou admissão dos bens - como é o caso -, a menos que
os proprietários concordem com essa hipótese. Numa resposta enviada ao
Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, esta terça-feira, o
gabinete do secretário de Estado da Cultura explicou que as obras já não
podiam ser classificadas porque os proprietários “o recusaram”. A Parvalorem
confirma não ter concordado com a classificação.
Quadros
vão voltar a Portugal para dar reinicio ao processo de exportação das obras do
pintor catalão
Contrato
atribui à Christie’s a responsabilidade de obter “todas as licenças e autorizações”
Mesmo que a Parvalorem e a
Parups concordem com o acordo proposto pela Christie’s, um novo leilão ainda pode ser travado pela Justiça. A Procuradoria-Geral
da República (PGR) esclarece que as questões jurídicas relacionadas com o
caso estão “em apreciação no âmbito dos processos pendentes no Tribunal
Administrativo do Círculo de Lisboa”: além da providência cautelar que
prossegue tendo em vista a suspensão da venda das obras, o Ministério Público
interpôs uma outra, “com vista à suspensão das deliberações e actos referentes
à alienação das obras de arte de Miró”.
Francisco Nogueira Leite,
presidente do conselho de administração da Parvalorem, assegura que os quadros
regressarão “oportunamente para Portugal”, após a colecção ter
sido retirada na terça-feira pela Christie’s do leilão em Londres. Em
declarações ao i, o presidente da empresa pública adiantou ainda que as opções
quanto ao futuro da colecção e a uma nova tentativa de venda estão ainda “em análise”.
Passos Coelho reforçou que
os quadros voltarão ao país “a curto prazo”, mas está certo quanto ao futuro da
colecção: “as sociedades detentoras desse conjunto de obras agora terão de
reavaliar a situação, seja com a leiloeira que já tinha ganhado o concurso
para proceder à sua alienação, seja eventualmente com outras leiloeiras”. Ficar
com os quadros não é uma opção para o primeiro-ministro que admitiu que o
Estado “não tem 30 a 40 milhões de euros para investir naquelas obras”. O líder
do executivo disse ainda lamentar que o processo “não tivesse seguido, do ponto
de vista legal, todas as obrigações que deveriam ter sido respeitadas”,
culpando, tal como ontem a Parvalorem apontou em comunicado, a Christie’s por não ter seguido todos os passos legais que eram da sua
responsabilidade segundo o contrato estabelecido para vender as obras.
Enquanto Cavaco Silva
preferiu não comentar o assunto, apesar de declarar que aprecia “muito” Miró, o
líder da oposição não hesitou em criticar o governo. “O governo meteu-se numa
enorme trapalhada de onde agora tem dificuldade em sair” é a opinião de António José
Seguro que considera ainda que as obras poderiam atrair ao país “todos
aqueles que gostam de pintura”.
No parlamento, para além de
um novo pedido para ouvir o secretário de Estado da Cultura, o PCP disse
querer ouvir também a ministra das Finanças sobre este tema. Os comunistas
apresentaram um novo projecto de resolução para “regatar as obras” e protegê-las de nova venda.
Durante o plenário de ontem, Cecília Honório, do Bloco de Esquerda, afirmou
que os quadros teriam ido para Londres na mala diplomática do ministério dos
Negócios Estrangeiros. Tanto o ministério como os representantes legais da
Parvalorem já desmentiram a afirmação, apontando que o transporte foi executado
pela Christie’s.
“O Estado não tem 30 a 40 milhões de euros para investir
naquelas obras.
E se tivesse a possibilidade de gastar 30,40 milhões
[seria] em obras que pudessem ser mais relevantes para a nossa cultura”
Pedro Passos Coelho
Primeiro-ministro
“As obras regressarão, oportunamente para Portugal”
Francisco Nogueira Leite
Presidente do Conselho de
Administração da Parvalorem
“Aprecio muito Miró como pintor, mas entendo que tendo os
seus quadros emergido como uma arma de arremesso na luta político-partidária e
tendo havido uma decisão de uma juíza, eu não devo comentar o assunto”
Cavaco Silva
Presidente da República
“O governo meteu-se numa trapalhada de onde agora tem
dificuldade em sair.
O governo, que tem a responsabilidade de velar pelo
património nacional, teve uma opção muita clara: uma opção contra a cultura”
António José Seguro
Secretário-Geral do PS
Governo da Madeira compra quadro
a óleo de João Vaz por 11,6 mil euros
Secretaria Regional das Finanças assume política de aquisições de bens
culturais
••• O Governo
Regional da Madeira comprou recentemente um quadro a óleo de João Vaz por 11,6
mil euros.
A pintura “Uma menina
no miradouro” foi adquirida pela secretaria regional do Plano e Finanças na
sequência de uma proposta efectuada pelo Museu Quinta das Cruzes e a direcção
de serviços de Museus e do Património Cultural da Secretaria Regional da
Cultura.
Em declarações por
escrito ao i, o secretário regional das Finanças, José Ventura Garcês,
justificou a compra pelo facto de esta obra ser “do maior interesse, no
contexto de uma política de aquisições, para a valorização e enriquecimento
do património público da Região” e de “nenhum museu regional ou colecção
pública” no arquipélago possuir uma obra deste artista relacionada directamente
com a Madeira.
A pintura assinada
por João Vaz (1859- 1931) representa “uma menina no miradouro”, localizado
numa das mais emblemáticas quintas madeirenses, a Quinta da Vigia, hoje
património público da região e sede da Presidência do Governo Regional da
Madeira.
“Esta pintura integra
um raríssimo conjunto de obras de João Vaz, com representações da Madeira e
que, provavelmente, fizeram parte da sua ‘Exposição Madeirense’, realizada em
Lisboa após a deslocação do pintor à Ilha da Madeira, em 1920”, acrescentou o
governante, salientando que a obra vai “integrar o património público e
artístico da Região”, à semelhança do que já aconteceu “com outras aquisições,
em anos anteriores”, configurando “um importante apoio institucional na
salvaguarda de bens culturais relacionados com a história e a identidade
regional”.
Ventura Garcês
defendeu ainda que João Vaz “é a par de António Ramalho, o mais importante
pintor do naturalismo português”. A sua obra “tornou-se
ainda mais valorizada
e conhecida com a realização da exposição temporária ‘João Vaz 1859-1931 Um
Pintor do Naturalismo’, em 2005, na Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves, na
sequência de uma aprofundada investigação sobre a vida e a obra deste pintor,
insigne paisagista e considerado uma das figuras mais relevantes da pintura
portuguesa do período Naturalista”, acrescentou.
A obra foi adquirida
num leilão realizado pelo Palácio do Correio Velho, Leilões e Antiguidades.
João d’Espiney
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