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terça-feira, 30 de janeiro de 2018

“Exoneração" foi (como esperado) a palavra de 2017

POLÍTICA DESTAQUE
Redacção F8
30 de janeiro de 2018


O vocábulo “exoneração” é a Palavra do Ano 2017 em Angola, tendo recolhido 40% dos votos dos cibernautas angolanos, foi hoje divulgado numa cerimónia no Camões-Centro Cultural Português, em Luanda.


Segundo a Plural Editores, que organiza a iniciativa, participaram cerca de 2.500 cibernautas e, à palavra “exoneração”, seguiu-se “mudança”, que obteve 21% dos votos, e “divisas”, em terceiro lugar, palavra que alcançou 18% das intenções de voto.

A eleição da Palavra do Ano em Angola teve início, em Dezembro, dois meses após a tomada de posse do Presidente da República, João Lourenço, que empreendeu, desde então, a mudança de chefias militares, ordenou a exoneração de titulares de cargos públicos em organismos do Estado, na Polícia e na administração de empresas estatais, em áreas que vão dos diamantes, aos petróleos, da comunicação social à banca, abarcando os responsáveis do Banco Nacional de Angola, das televisões e da Sonangol.

“Mudança”, a palavra classificada em segundo lugar, a sua escolha é também justificada pela política angolana, onde tem havido várias mudanças desde o acto eleitoral, que levou João Lourenço, de 63 anos, à presidência da República, sucedendo a José Eduardo dos Santos, de 75 anos, no cargo que ocupou durante 38 anos, desde a morte do primeiro Chefe de Estado após a independência, Agostinho Neto.

“Divisas”, termo que fecha o pódio, foi escolhido devido à “conjuntura de crise económica, que levou a uma quebra na entrada de divisas no país, o que causou limitações no acesso a moeda estrangeira e dificultou as importações”, segundo a Plural Editores.

Da lista de dez palavras colocada à votação, em quarto lugar ficou “eleições”, com 07% dos votos, seguindo-se “professor” (04%), e “micha” (03%), um “termo informal muito utilizado para ‘facilitar’ alguns negócios, quando a ‘micha’ é oferecida a alguém, em troca de um favor ou benefício”.

No sétimo posto das preferências dos angolanos, com 02%, ficaram os vocábulos “candongueiro”, “barragem” e “kaluanda”, “termo que se tornou comum e é usado para designar algo ou alguém que é originário de Luanda”, segundo a mesma fonte.

“Candongueiro” é o nome dado ao meio de transporte mais utilizado em Angola, “o popular veículo de passageiros, geralmente pintado de branco e azul”, e a escolha de “barragem” deveu-se à inauguração, em Agosto do ano passado, da barragem hidroeléctrica de Laúca, na província de Malanje, “considerada a maior obra de engenharia civil de sempre em Angola, tida como a segunda maior barragem de África”.

No último lugar, com um por cento, ficou o termo “maka”, palavra frequentemente usada em expressões como “não há maka” ou “não tem maka”, para “descrever situações de fácil resolução”.

“Maka” significa conflito ou discórdia, é uma palavra que tem origem no kimbundu, dialeto falado em várias partes de Angola, nomeadamente no noroeste, que inclui a capital.

Em 2016, quando se realizou a escolha da “Palavra do Ano” pela primeira vez em Angola, a eleita foi “crise”, tendo mobilizado 31% dos votos.

E por falar em… exonerações

Alguém ainda se recorda que, para além do Folha 8, também a consultora BMI Research considera que a onda de exonerações em Angola, levadas a cabo por João Lourenço, significa apenas uma dança das cadeiras e não sinaliza a implementação das reformas que estes analistas consideram ser necessárias para o crescimento económico?

“As perspectivas de crescimento continuam magras para além de 2018, já que vemos poucos sinais de que o novo Governo de Angola vá implementar o tipo de reformas necessárias para atrair investimento para a economia”, escrevem os analistas desta consultora do Grupo Fitch.

Na nota enviada (Novembro de 2017) aos investidores, os analistas escrevem que “apesar de João Lourenço ter feito mudanças surpreendentes de pessoas em instituições estratégicas, nomeadamente o despedimento de Isabel dos Santos, não acreditamos que elas significam o início de um fôlego reformista”.

Pelo contrário, continuam, “acreditamos que ao instalar os seus ministros como líderes da companhia petrolífera nacional e do banco central, João Lourenço está simplesmente a tentar estabelecer a sua rede de apoio e sair da sombra da família de Eduardo dos Santos”.

Na opinião dos consultores da BMI, apesar dos discursos a favor da eliminação dos monopólios em áreas estratégicas como as telecomunicações e a construção, “é improvável que o novo Presidente consiga desafiar as redes de conluio que permitiram a sua chegada ao poder”.

A BMI antevê uma pequena subida da produção de petróleo, que “impulsionará o crescimento em 2018 para 3,2%, mas uma perspectiva de evolução relativamente sombria para o sector dos hidrocarbonetos vai fazer com que o crescimento económico de Angola se mantenha estruturalmente fraco, caindo para 2,4% em 2019”, conclui a BMI.

Sobre a Sonangol, empresa do regime, a BMI Research diz que, “apesar de ter [sido] apresentada uma visão impressionante para a empresa, tem havido pouca evidência de reformas no que diz respeito à própria companhia e à sua relação com as companhias internacionais de petróleo que operam nas águas do país”.


O petróleo, como dizem de vez em quando os donos do país, “é uma riqueza que serve a população”. 
Sendo que quem determina quem é esta população é o MPLA (o mesmo MPLA que tudo domina há 42 anos), no caso do petróleo João Lourenço apenas substituiu a raposa, mantendo as galinhas sujeitas ao livre arbítrio dos seus novos amigos.

A exoneração de Isabel dos Santos é simbólica. 
E isso também é importante, reconheça-se. 
Mas não chega. 
O problema de Angola não é das pessoas mas do regime que governa Angola há 42 anos, 16 dos quais em paz total. 
E foi esse regime que “educou”, moldou e formatou João Lourenço e o seu núcleo duro.

Assim sendo, a Sonangol vai continuar a ser uma empresa opaca e ineficiente. 
Tanto faz lá estar no comando Isabel dos Santos ou Carlos Saturnino. 
O problema é estrutural e, se calhar, não há antibióticos capazes de curar a doença. 
Será mesmo preciso amputar alguma coisa.

Não nos admiremos, pois, que a Sonangol continue a ser o que tem sido ao longo de décadas. 
Uma empresa opaca e ineficiente que, cada vez mais, está nas mãos dos credores e investidores internacionais.

João Lourenço pouco (sejamos optimistas) conseguirá fazer na Sonangol (como noutras empresas) porque o problema não está nas pessoas mas no modelo adoptado, cimentado e blindado há muitos anos. 
Ou seja, Angola é um petro-Estado. 
Como está no ADN do MPLA, uma simbiose de marxismo, nepotismo e outros ismos que rimam com corrupção, o importante é deixar incólume a “galinha dos ovos de ouro” (como disse João Lourenço) e ir mudando os responsáveis pelo galinheiro, numa metodologia de repartir por mais, por outros, o saque feito ao longo de, pelo menos, 38 anos.

Tirando medidas cosméticas, a Sonangol não tem mostrado vontade (e com o tempo a doença agrava-se) de apostar alguma coisa para ser mais transparente e cumprir os padrões de uma governação suficiente racional, já que pedir uma governação boa é uma miragem e exigir uma governação excelente só será possível quando se retirarem as vogais da nossa língua.

A Sonangol continua e continuará, chame-se o seu PCA Carlos Saturnino, Isabel dos Santos, João Lourenço ou Bento Kangamba, fortemente endividada com problemas de liquidez que sendo intermitentes tendem a ficar cristalizados.

A tudo isso acresce que os protagonistas escolhidos por João Lourenço são todos “filhos” da mesma mãe: o MPLA. 
E assim sendo, foram todos educados (mais uns do que outros, é certo) numa tese típica e genética nas ditaduras, que diz que o importante não é roubar, é fazer com que se não saiba que se roubou.

Folha 8 com Lusa

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