POLÍTICA Destaque
Redacção F8
4 de Julho de 2018
Paulo Rangel, eurodeputado do PSD, foi o único português presente no almoço de trabalho com João Lourenço, em Estrasburgo, na qualidade de vice-presidente da bancada parlamentar do Partido Popular Europeu (PPE).
Mas – claro! – ficou saciado.
O eurodeputado social-democrata salientou hoje a determinação do Presidente de Angola em projectar o país como estando bem preparado para um período de investimento estrangeiro muito forte.
“Esteve a traçar uma visão de um país que está a fazer um percurso para se abrir completamente e para se desenvolver, algo que o Presidente acha que vai ser relativamente rápido, embora saiba que não se pode querer tudo num dia”, contou Paulo Rangel, embora fazendo questão de esclarecer que será uma abertura… em termos económicos.
“O que foi sublinhado ao almoço foi a vontade de criar condições para haver um investimento que não esteja dependente da arbitrariedade da corrupção.
Houve muito a ideia de passar a imagem de um país que está a preparar-se para um período de investimento estrangeiro muito forte, e de um investimento diversificado, e preferencialmente europeu”, sublinhou.
Num almoço em que João Lourenço falou preferencialmente em português, embora tenha feito uma excepção no diálogo com o presidente do Parlamento Europeu (PE), Antonio Tajani, com quem conversou em espanhol, o tema de um futuro Plano Marshall para África foi também abordado.
“Falou-se do Plano Marshall muito com o intuito de apostar no desenvolvimento financeiro para diminuir os fluxos migratórios, ou pelo menos os fluxos migratórios em desespero, que é o que temos hoje”, completou.
O vice-presidente do grupo político do PPE, o maior do PE, referiu que o nível de aceitação, pelo menos retórico, desta ideia, defendida quer por Tajani, quer pela chanceler alemã Angela Merkel, é “muito grande”.
Paulo Rangel destacou ainda o facto de João Lourenço, que hoje se tornou o primeiro presidente de Angola a discursar no hemiciclo, ter sido aplaudido de pé, algo que “não é muito comum com um chefe de Estado fora da Europa”.
“Foi lido, e também lhe foi transmitido, como um encorajamento devido aos sinais de abertura deste ano, em termos de liberdade de expressão, em termos de luta contra a corrupção”, finalizou.
Plano Marshall
O presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, defendeu no dia 22 de Novembro de 2017 que a União Europeia deve conceber “um verdadeiro ‘Plano Marshall’ para África”, considerando que o plano de investimento actual não é suficiente.
Das duas uma: Ou é uma forma sofisticada de neocolonialismo, ou uma estratégia para pedir aos pobres dos países ricos para dar aos ricos dos países pobres.
Intervindo numa conferência de (suposto) alto nível sobre “uma nova parceira com África”, organizada pelo Parlamento Europeu em vésperas da V Cimeira UE-África, que teve lugar em Abidjan nos dias 29 e 30 desse mês, Tajani defendeu que a Europa deve “enviar um sinal claro da sua determinação em relançar e reforçar a parceria”.
Segundo o presidente do Parlamento, “o plano de investimento de 3,4 mil milhões de euros para África é um passo importante na direcção certa, mas está longe de ser suficiente”. Então, pensa Antonio Tajani, a solução não é (passe o exagero) ensinar-nos a pescar mas, antes, despachar para cá umas toneladas de peixe.
“Devemos apoiar os esforços que os africanos estão a levar a cabo para estabelecer uma base de produção sustentável e desenvolver uma agricultura eficaz, fontes de energias renováveis e água, energia, mobilidade e infra-estruturas logísticas e digitais adequadas”, sustentou, defendendo então que a abordagem indicada seria desenhar um “Plano Marshall para África”, numa alusão ao programa concebido pelos Estados Unidos da América para apoiar a recuperação da Europa depois da II Guerra Mundial.
Segundo Tajani, com um “Plano Marshall”, a Europa iria “fortalecer a boa governação e o Estado de direito, melhorar a luta contra a corrupção e ajudar a emancipação das mulheres e educação”.
A boa governação consegue-se quando não se negoceia com maus governos, governos corruptos, com ditadores.
Um Estado de direito ajuda-se quando se apoiam as democracias e não, como faz a Europa, quando dá tanto jeito manter governos (Angola, Guiné Equatorial etc.) amigos mesmo que sejam esclavagistas.
Quanto à corrupção, quem são os corruptores?
São, em grande parte, europeus.
“Temos de trabalhar para garantir que, no quadro do próximo orçamento plurianual da UE, pelo menos 40 mil milhões de euros são consagrados ao fundo de investimento para África”, defendeu, argumentando que as sinergias geradas em torno do financiamento disponibilizado pelo Banco Europeu de Investimento “poderia tornar possível mobilizar cerca de 500 mil milhões de euros em investimento público e privado”.
Defendendo que todos os esforços devem concentrar-se nos jovens, pois são eles que “têm a chave para uma África mais estável, próspera e moderna”, Antonio Tajani disse ainda que é necessário criar um ambiente favorável ao desenvolvimento do empreendedorismo e criação de pequenas e médias empresas e de emprego para os jovens.
“Para tal, precisamos também de instrumentos como o Erasmus para jovens empreendedores, que deveria ser alargado para abranger África”, sugeriu.
Margaret Thatcher e Mo Ibrahim
O magnata britânico de origem sudanesa, Mo Ibrahim, responsabiliza as “falhas monumentais dos líderes africanos após a independência”, explicando sem meias palavras (coisa cada vez mais rara) que, “quando nasceram os primeiros Estados africanos independentes, nos anos 50, África estava melhor em termos económicos”.
Mo Ibrahim diz que os interesses da Europa apenas podem ser duravelmente garantidos pela democracia e não pelo apoio aos ditadores.
“Se a Europa quer garantir a longo prazo os seus interesses, ela tem todo interesse em se aproximar dos povos africanos.
Pensar que a conivência com os ditadores seria benéfica é um grande erro”, afirma Mo Ibrahim.
Este empresário, que fez fortuna na telefonia celular ao criar o operador CELTEL que se tornou depois ZAÏN, qualificou de “vergonhoso e um golpe à dignidade” a contínua dependência de África em relação ao ocidente, tendo em conta os “recursos impressionantes” que abundam no continente.
“Não se justificam a fome, a ignorância e a doença que assolam África”, disse Mo Ibrahim, para quem a solução terá de passar obrigatoriamente por “bons líderes, boas instituições e boa governação”, sem os quais “não haverá Estado de Direito, não haverá desenvolvimento”.
Mo Ibrahim recorda que “havia uma África na qual o Estado era o único proprietário dos meios de informação, na qual a única televisão pertencia ao poder, na qual toda a informação era controlada.
Esta África já não existe”.
Por isso, “o que aconteceu na Tunísia e no Egipto nunca teria sido possível sem as tecnologias de informação e comunicação.
Apesar dos esforços colossais, os Governos destes dois países não conseguiram impedir a circulação das informações.
Nesta nova África, o povo é o único soberano e os nossos amigos europeus devem persuadir-se disso”.
Comparando o posicionamento europeu com o norte-americano, Mo Ibrahim entende que “os americanos escolhem geralmente muito claramente a democracia e a luta contra a corrupção na sua relação com os Estados africanos.
Seria bom que os nossos amigos Europeus fizessem o mesmo”.
Em relação às posições da Europa, recordemos que Margaret Thatcher, que em Maio de 1979 se tornou a primeira mulher a dirigir um governo britânico, proibiu nesse ano o seu enviado especial à então Rodésia (hoje Zimbabwe) de se encontrar com Robert Mugabe.
E fê-lo para defender a democracia?
Para lutar contra as ditaduras?
Não. O argumento, repare-se, era o de que “não se discute com terroristas antes de serem primeiros-ministros”.
“Não. Por favor, não se reúna com os dirigentes da ‘Frente Patriótica’.
Nunca falei com terroristas antes deles se tornarem primeiros-ministros”, escreveu – e sublinhou várias vezes – numa carta do Foreign Office de 25 de Maio de 1979 em que o então ministro dos Negócios Estrangeiros, Lord Peter Carrington, sugeria um tal encontro.
Ou seja, quando se chega a primeiro-ministro, ou presidente da República, deixa-se de ser automaticamente terrorista.
Não está mal.
É verdade que sempre assim foi, mas não tem de continuar a ser.
Folha 8 com Lusa
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