RUI RIO
David Dinis
27 de Fevereiro de 2018, 6:27
Rui Rio não cede, mas o Presidente teme pelo efeito de um PSD dividido à beira de eleições - e ainda sem agenda de oposição.
Ontem, Marcelo avisou: "Temos poucos meses para consensos".
Marcelo recebeu Rui Rio na segunda-feira a seguir ao congresso e, de novo, na segunda-feira seguinte.
Pelo meio, passaram sete dias e uma mão cheia de polémicas dentro do “novo PSD”.
O Presidente acompanhou tudo, à distância, ocupado por uma visita oficial a São Tomé e Príncipe, e desvalorizando aos jornalistas (“o acessório é acessório”).
Mas voltou mais preocupado do que partira para o segundo encontro numa semana, apurou o PÚBLICO.
O contexto está na memória de todos - sobretudo de sociais-democratas.
O PSD viu Elina Fraga a justificar uma auditoria à sua gestão na Ordem dos Advogados, que até Pacheco Pereira (um aliado de Rio) desdenhou; seguiu o encontro de Rui Rio com António Costa, contando as duas horas e meia e aguardando o momento em que o líder falaria com Assunção Cristas ou com os seus deputados; e viu Fernando Negrão ser eleito líder parlamentar com apenas 40% dos votos.
E com tudo isto ficou com a certeza de que nenhuma das partes, nova liderança ou velhos críticos dela, está com vontade de enterrar o machado de guerra.
Regressado de terras de África, o Presidente pôs-se a par da turbulência.
E a alguns dos mais próximos mostrou-se preocupado com o que viu.
“O Presidente deve ter vindo com os cabelos em pé”, disse Marques Mendes, conselheiro de Estado, no seu comentário na SIC.
No Palácio de Belém, o estado de espírito confirma os receios com a desunião do maior partido da oposição.
E com a forma como Rui Rio parece querer lidar com ela, em confronto com os críticos internos, achando que o que perde em desunião, pode ganhar na imagem que dele terá o país.
Na equipa do novo líder “laranja”, isto tem uma lógica: “Rui Rio não acha que tenha perdido nada perante o país.
De fora para dentro, parece que lhe estão a criar dificuldades a ele”.
Em Belém, teme-se que a percepção não seja exactamente essa: “Só falta um ano e meio para as legislativas.
Se o PSD for partido para as eleições, desafiando oito anos da liderança anterior, é dar uma maioria absoluta a António Costa”, diz uma fonte ouvida pelo PÚBLICO. ~
E maioria absoluta, já se sabe, é cenário de que em Belém se prefere nem ouvir falar.
Mas não é só pelo estilo, que se receia em Belém um confronto aberto no PSD.
É também pela estratégia: “Metade do PSD não quer consensos com o PS”.
E se não quer, apostar tudo neles pode ser um erro.
Por exemplo: “Quando Rui Rio diz que quer ir mais longe na descentralização, esse PSD entende isso como um reforço do poder dos autarcas do PS”.
Ontem, à saída do almoço de trabalho com o Presidente, o novo líder social-democrata deu, aliás, meio passo atrás neste tema, que se lê nas entrelinhas: “O que está em cima da mesa é apenas uma parte da descentralização, que tem a ver com a passagem de competências para os municípios, mas isso é só uma parte”, disse Rui Rio, atirando para depois a sua proposta mais estruturada sobre o que se deve seguir.
"A descentralização é muito maior, é preciso fazer direito, com calma e com tempo”.
Quanto a Marcelo, avisou também ontem à tarde que os consensos devem ser feitos já, sem perder mais tempo - porque depois vêm as eleições: "Temos pouco meses, muito poucos, para debatermos e decidirmos o que há a decidir (...).
Não é daqui a meses, em pleno ano eleitoral de 2019, quando já for tarde".
Começou por dar exemplos de áreas onde eles são desejáveis no plano europeu: crescimento e o emprego, as migrações, o futuro da união monetária ou a segurança e defesa, o relacionamento com a Aliança Atlântica, o papel da União Europeia no mundo.
Mas limitou os temas sobre os quais espera convergências aos fundos estruturais pós-2020 e descentralização: “Nós portugueses, [temos muito poucos meses] para debatermos como vamos lutar para não deixarmos perder a coesão social e territorial, e que prioridades vamos eleger cá dentro e na Europa, para o período crucial iniciado em 2021”, afirmou.
“É agora que temos de pensar, de falar, de juntar esforços, de promover convergências, de definir e tentar fazer vingar objectivos”, sublinhou.
Uma corrida contra o tempo
Mas é aqui que encaixa a outra preocupação que reina em Belém.
A da necessidade de o novo PSD ter um conjunto de propostas estruturadas sobre os temas principais, menos centradas nos consensos e mais na diferenciação face ao PS, como referia o Expresso deste sábado.
Mas não há, ainda.
No primeiro encontro, Rio fez questão de dizer ao Presidente que não tinha ainda posições definidas, nem sequer sobre os temas que António Costa pôs na agenda e que o novo PSD aceitou negociar.
Ontem, na véspera da primeira das reuniões entre Governo e PSD sobre fundos europeus, Rio repetiu aos jornalistas não ter levado "projectos de lei e propostas" numa pasta.
O novo presidente do partido vai pedindo tempo para apresentar ideias, mas “vai ser uma corrida contra o tempo”, diz uma fonte próxima ouvida pelo PÚBLICO.
Porque “Rio não é Cavaco”, que apareceu do nada, mas tinha sido ministro das Finanças três anos antes e tinha mantido acesso à informação.
Rio não é Cavaco, portanto, porque está fora da política nacional há 16 anos e fora da Câmara do Porto há quatro.
Conhecerá a realidade? - questiona a mesma fonte.
Para já, só os consensos avançam - e em território seguro.
E sem que Marcelo se envolva demais.
Esse aviso já tinha sido feito antes, aquando do primeiro encontro: “Foi perguntada a receptividade do Presidente, não para pilotar, não para patrocinar, mas para acompanhar esse esforço”.
Para isso, sim, “a resposta só podia ser uma”, descreveu Marcelo aos jornalistas, sempre carregando nos “nãos” da resposta.
Agora, a questão central sobre o futuro do PSD está na bancada parlamentar.
Aquela onde Rui Rio ainda não foi - e que o desafiou na primeira oportunidade.
Marcelo, que ia todas as semanas reunir com deputados quando foi líder, desconfia que a confrontação não seja a melhor estratégia.
Porque só falta ano e meio.
Pelo que isso pode provocar de agitação adicional, de reacção dos críticos em confronto com a liderança.
“Como é que o PSD chega às eleições assim?”
* com S.S. e L.B.
david.dinis@público.pt
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