ISABEL ARRIAGA E CUNHA (Bruxelas) 15/01/2014 - 23:43
O diretor do fundo de socorro do euro, conhecido por ESM, diz que o ajustamento representa “uma carga muito pesada para as pessoas”, mas é fundamental para regressar a um crescimento sustentável.
Os países que beneficiam da ajuda da zona euro e do Fundo Monetário Internacional (FMI), como Portugal, Grécia e Chipre, não tinham alternativa senão proceder a um “doloroso ajustamento orçamental” cujo ritmo está dependente da quantidade de financiamento disponível.
Esta posição foi defendida nesta quarta-feira por Klaus Regling, director do fundo de socorro do euro (ESM na sigla inglesa, e do seu antecessor provisório EFSF que financia Portugal e Grécia) perante a comissão económica e monetária do Parlamento Europeu (PE) que está a analisar a acção da troika de credores internacionais que negociou e acompanha os programas de ajustamento económico e financeiro assumidos por Portugal, Grécia, Irlanda e Chipre em troca da ajuda externa.
Regling reconheceu que o ajustamento representa “uma carga muito pesada” para muitas pessoas em resultado de reduções de salários e pensões, cortes das despesas públicas e das prestações sociais e aumento do desemprego.
Também reconheceu que uma “característica comum de injustiça” dos programas de ajustamento, é que, enquanto os ricos conseguem muitas vezes escapar à austeridade, o resto da população não tem forma de fazer o mesmo porque é penalizada com os aumentos dos impostos.
“Compreensivelmente, este sofrimento temporário provoca muitas vezes cólera e frustração na população”, o que “torna as pessoas receptivas a sugestões de que poderia existir uma outra saída da crise de alguma forma indolor”, prosseguiu Regling, rematando: “Essa outra opção é uma ilusão”.
A alternativa aos programas de ajuda teria sido ainda mais dolorosa, porque teria provocado um “incumprimento (default) desordenado da dívida, o colapso da economia e a saída da união monetária” dos países em causa, o que, frisou, provocaria “ainda mais sofrimento” porque o ajustamento teria de ser feito “de um dia para o outro” através de uma redução “brutal” das despesas para o nível das receitas fiscais.
Em contrapartida, defendeu, os empréstimos da zona euro e do FMI “permitem aos países sob programa comprar tempo para realizar o necessário ajustamento durante um período mais longo”.
“Se o EFSF não tivesse sido criado há três anos, creio que Grécia, Portugal e Irlanda já não estariam no euro” e “estaríamos a viver num mundo muito diferente”, afirmou.
Regling frisou igualmente que o ritmo do ajustamento que os países ajudados têm de efectuar depende da quantidade de dinheiro que os parceiros estão dispostos a disponibilizar.
O que significa que este processo só poderá ser lento se os montantes em causa forem muito elevados.
Isto porque “quanto mais lento for o ajustamento orçamental, mais financiamento externo de emergência será necessário”, vincou.
Só que, lembrou “há limites para a generosidade dos amigos e parceiros”, o que significa que “o ritmo do ajustamento tem de estar em linha com o dinheiro disponível”.
Regling reiterou, no entanto, a convicção de que os países ajudados estarão em boa posição no plano económico dentro de “cinco, seis, sete, oito anos”.
Em apoio da sua previsão citou o exemplo de países que sofreram graves crises comparáveis, como Brasil, Indonésia ou Coreia, que estão hoje entre as economias que mais cresceram nos últimos anos.
O director do ESM garantiu, por outro lado, que não é a troika (formada pela Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI) que impõe as medidas de redução dos défices orçamentais ou de reformas estruturais aos Estados.
Tanto não impõe que foi o Governo português, e não a troika, que decidiu as medidas alternativas às que foram chumbadas pelo Tribunal Constitucional, exemplificou, insistindo em que a troika se limita a fixar as metas para os défices, cabendo aos governos decidir como lá chegar.
Os dois eurodeputados que conduzem a posição do PE sobre a acção da troika – o conservador austríaco Othmar Karas e o socialista francês Liem Hoang Ngoc – também reconheceram que os programas de ajuda e o ajustamento orçamental associado eram inevitáveis.
A grande questão que o PE se coloca, defendeu Hoang Ngoc, tem a ver com a falta de legitimidade da troika para impor políticas aos Estados.
A ilustrar a sua dúvida, o deputado afirmou que foi a troika que não permitiu que Portugal aumentasse o salário mínimo para 500 euros.
E referiu, ainda, que o ex-primeiro ministro português, José Sócrates, disse aos eurodeputados que se deslocaram a Lisboa no quadro da sua análise, que, em 2011 (depois do chumbo do chamado PEC 4), foi pressionado por Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia (uma das três instituições da troika) a endurecer as medidas de consolidação orçamental para poder beneficiar da ajuda da zona euro e do FMI.
“Quem é que decide que é preciso baixar os salários na Grécia?” interrogou-se o eurodeputado francês, considerando que decisões destas não têm qualquer base jurídica e, consequentemente, legitimidade democrática.
No mínimo, defende, falta, ao nível europeu, “um contra-peso democrático” para a acção da troika.
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