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quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Incerteza em Berlim


Francisco Sena Santos

Opinião
Francisco Sena Santos
21 nov 2017 13:21

É uma boa notícia para a Europa que Merkel tenha recusado ceder aos liberais FDP. 
Eles exigiam o estratégico posto de ministro das Finanças no governo da Alemanha para porem em ação o seu plano de travagem de qualquer ambição de solidariedade financeira na Europa. Mas é inédito, nas sete décadas de existência da República Federal, que o sistema eleitoral não proporcione uma aliança para formar governo.

O atual impasse político alemão é, em parte, a consequência da erupção de mais uma força política no parlamento de Berlim, os neo-fascistas do AfD, que receberam em setembro mais de cinco milhões de votos, representando 12,6% do eleitorado. 
Obviamente, uma força que nenhum partido tradicional aceita ter por parceiro. 
Mas que foi buscar eleitores a todos: a CDU/CSU, de Merkel, em quatro anos, caiu de 41,5% para 33% e o SPD caiu cinco pontos e com 20,5% teve o pior resultado de sempre para a social-democracia alemã. 
Vale acrescentar o peso eleitoral dos outros partidos nas eleições de 24 de setembro passado: FDP (liberais, à direita): 10,7%; Die Linke (esquerda socialista): 9,2%; Grune (verdes, centro-esquerda):8,9%.

Merkel pagou nas eleições e está a pagar o preço da coragem que teve ao tomar a impopular medida de abrir as portas da Alemanha aos refugiados. 
Em 12 anos de mandato, a chanceler tornou-se a figura política mais poderosa na União Europeia. 
Muitas vezes criticada – designadamente pelos países do sul, pelas suas políticas de dura austeridade -, Merkel tornou-se personagem fulcral para o equilíbrio da Europa.

A chanceler impôs-se como a única estadista credível no topo da Europa
Tem sido ela quem, com autoridade, responde a Trump, a Putin a Xi Jinping ou a outros. Foi ela quem deu luz verde ao presidente do BCE, Mario Draghi, para ativar uma política monetária que possibilitou o financiamento para o relançamento económico da Europa. Tem sido ela quem, com Macron, lidera a resposta europeia ao Brexit britânico.

A “mutti” (a mãezinha, como também é conhecida pelo estilo maternal), parecia estar para durar na liderança. 
Nunca apareceu alguém forte na linha de sucessão. 
Agora, a crise política e a incerteza no país mais determinante na Europa significa uma debilidade – temporária – para a Europa. 
Os britânicos pelo Brexit já estão a celebrar esta turbulência do lado europeu.

É facto que Merkel é acusada de governar em absolutismo e de ser pouco inspiradora. 
Tem uma previsibilidade que corta a surpresa criadora. 
O seu método pacientemente pragmático, híper-racional, quase científico, não produz grande química com muita cidadania. 
Há quem a responsabilize por muito imobilismo europeu.

A audácia que revelou na crise dos refugiados elevou-a ao estatuto de estadista. 
Vai continuar na liderança? 
É de admitir que o recurso a novas eleições mantenha ou até agrave os impasses aritméticos do voto de há dois meses.

O Conselho Europeu de dezembro tem sobre a mesa a política de apoio aos migrantes. 
A Polónia e a Hungria são ativamente hostis às medidas – já em fase restritiva – de acolhimento impulsionadas por Merkel. 
Com Merkel debilitada, vem aí uma Europa mais fechada nos diferentes nacionalismos internos? 
E o que vai acontecer à reforma financeira da Europa liderada pelo par Merkel/Macron?

O que vem a seguir é um compromisso político que não está à vista ou uma renhida campanha eleitoral? 
O que vier a acontecer em Berlim – o futuro próximo com ou sem Merkel – diz-nos respeito a todos. 
Anunciam-se tempos de incertezas.

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