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domingo, 29 de março de 2015

Vladimir Putin - Diplomacia à moda de Estaline

Abril 2015
DE  IALTA A MINSK


Há 70 anos, as grandes potências dividiam a Europa, em Ialta.
Agora, Putin quer ser o novo São Jorge e esmagar o dragão europeu, e assim se apresentou nas negociações de Minsk sobre o leste da Ucrânia.
Consegui-lo-á? 
Com que custos?

A MAIS ARBITRÁRIA DAS FRONTEIRAS
Setenta anos depois da Conferência de Ialta, os chefes de Estado voltaram a reunir-se para negociar o limite entre Leste e Ocidente.
Será sempre uma fronteira artificial, visto não existir uma civilização "ocidental" e outra "euroasiática".
Jornal THE GLOBE AND MAIL - Toronto
Autor: Doug Sauders - 14.02.2015
Tradutora: Fernanda Barão

Há 70 anos, os dirigentes do Reino Unido, Estador Unidos e União Soviética reuniram-se na Crimeia, para negociar a linha divisória entre o mundo ocidental e o mundo oriental.

Essa linha era completamente arbitrária e não tinha em conta nações, línguas, culturas nem características geográficas.
Cortava Berlim ao meio e redesenhava a maior parte dos países do centro da Europa.
Não se baseava em qualquer definição fundamental de "Ocidente" e "Leste" - pois não existe nenhuma - nem no desejo ou sentimento de identidade dos cidadãos afetados.
Baseava-se apenas na força militar bruta e num mero compromisso político.

Ao longo de 45 anos, essa linha que marcava a fronteira do mundo ocidental transformou-se numa sólida realidade política, económica e até mesmo cultural.
Deslocou-se abruptamente, em 1990, com o colapso do Pacto de Varsóvia e da União Soviética, e voltou a deslocar-se com o alargamento da União Europeia, no começo dos anos 2000.

Agora, no aniversário da Conferência de Ialta  [realizada entre 4 e 11 de fevereiro de 1945], dirigentes de primeiro plano reuniram-se em Minsk para, uma vez mais, negociarem uma linha de divisão entre o Leste e o Oeste.
E, uma vez mais, o resultado teve que ver apenas com força bruta e poder político.

Que move Vladimir Putin?
Ninguém sabe realmente o que pretende alcançar o Presidente russo Vladimir Putin com a sua guerra no leste da Ucrânia - nem mesmo ele próprio parece ter uma ideia muito clara.
Conhece-se, contudo, o argumento em que assenta a sua campanha autodestrutiva para semear o caos nas fronteiras da Ucrânia, da Geórgia e de outras regiões.
Tem sido avançado, com cada vez maior insistência, pelo próprio Putin e pelo ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov: há pessoas que são ocidentais e pessoas que são de leste, consoante a sua religião, a sua língua e a sua origem étnica, e as zonas onde estas vivem são entidades permanentes, o Ocidente e o Leste.

Não se pode dizer que este raciocínio seja novo, mas tinha desaparecido durante muito tempo, sobretudo na Rússia.
Mesmo durante os dois mandatos de Putin na chefia do Executivo [1999-2000 e 2008-2012], um aspecto sobre o qual reinava amplo consenso era o de que o país se aproximava gradualmente das instituições europeias.
Alguns comandantes militares disseram-me que era inevitável uma união militar entre a Rússia e a União Europeia, porque ambas enfrentavam os mesmos inimigos.

Fazia sentido.
Durante a Guerra Fria, a Europa construiu um conjunto de instituições e infraestruturas políticas, comerciais, jurídicas, económicas e educativas bem sucedidas (e um sistema monetário menos  bem sucedido).
Os de fora não querem aderir ao sistema
O "Ocidente" é um conjunto de instituições e afinidades que se aplicam a qualquer povo que as queira fazer suas
Qualquer coisa mudou.
Recentemente, Putin passou a referir-se aos seus eleitores não como "Rossisskii" - cidadãos da Rússia - mas como "Russkii" - membros de etnia russa - e a falar muito do "euroasianismo", uma filosofia estranha, que defende que os eslavos e os seus vizinhos cristãos ortodoxos sãi uma "civilização" distinta e incompatível com outras, como a ocidental ou o Islão.
Por conseguinte, todos os cidadãos de etnia e língua russas da Ucrânia e de outros países fronteiríços fazem parte de um "Leste" fixo e imutável.

Este tipo de ideias tem adeptos no Ocidente.
Quando, há uma década, rejeitaram a candidatura da Turquia à União Europeia, os dirigentes da França e da Alemanha referiram cruamente que o Ocidente se definia pela relegião, pela etnia e pas origens históricas.
O facto provocou vivas reações na Rurquia e o atual Presidente, Recep Tayyip Erdogan, em tempos pró-europeu, parece estar agora a aliar-se a Putin e a aderir à falsa lógica de uma civilização antiocidental.

Uma questão de mentalidade
Há muito que deveríamos ter aprendido que aquilo a que chamamos o "Ocidente" é simplesmente um conjunto de instituições e afinidades que se aplicam a qualquer povo que as queira fazer suas, independentemente da religião, da etnia e da história.
(O Japão e a Coreia do Sul, por exemplo, não tiveram dificuldade em adotá-las).
A Polónia e a República Checa passaram, quase de um dia para o outro, de sociedades "com mentalidade oriental" para sociedades "de mentalidade ocidental", simplesmente por terem aderido às instituições ocidentais e porque os seus povos queriam estar no Ocidente.

A "União Euroasiática" de Putin não se materializa precisamente porque assenta em reinvindicações políticas e étnicas e não em instituições que funcionam.
A Ucrânia já viveu duas revoluções que exprimiam o desejo do povo de aderir às instituições europeias.
O ano passado, os ucranianos - inclusive a maioria dos ucranianos de língua russa - votaram em massa em partidos pró-europeus.

Isso não impede nenhum deles de se sentir próximo da Rússia, nem nenhum russo de querer fazer parte do nosso clube.
Não há pessoas do Ocidente e pessoas de Leste e as linhas que nos dividem são artifícios nascidos da força e de um poder distante.
Tudo indica que estamos condenados a aprendê-los da pior maneira.



UMA NOITE DE INVERNO EM IALTA ...
Na célebre conferência tripartida que se realizou em fevereiro de 1945, na península da Crimeia, fixaram-se as novas fronteiras europeias.
Todos tinham cartas na manga e dali saiu a divisão da Europa em duas zonas de influência:a do Ocidente e a da URSS.
REVISTA  OGONIOK  - Moscovo
Autor: Leonid Mletchine - 09.02.2015
Tradutora: Fernanda Barão

Diz-se que o próprio Winston Churchil apresentou a Estaline o plano de partilha da Europa de Leste.
Mas isso foi antes de Ialta, em outubro de 1944, por ocasião da visita do primeiro-ministro britânico a Moscovo.
Churchil achara "o tio Zé mais conciliador que nunca" e deu a Estaline uma folha  na qual tinha esboçado as percentagens de influência daURSS e do Reino Unido em cada país da Europa: 90% para os britânicos na Grécia, 50-50 na Iugoslávia e na Hungria, 75% para a URSS na Bulgária.
Estaline aceitou a divisão de esferas de influência propostas por Churchil.
Contudo, como os norte-americanos no viam com muito maus olhos, o acordo não foi mais longe.

Para alguna, esta iniciativa do primeiro-ministro britânico traduz o hábito cínico das grandes potências de decidir o destino dos outros povos.
Eisso nunca lhe foi perdoado.
Outros consideram sensata essa tentativa de perservar para o Ocidente algumas posições estratégicas na Europa central e oriental.
Os dirigentes ocidentais sabiam que as suas hipóteses de influenciar o futuro da Europa do Leste eram reduzidas.
Assim, antes do voo para Ialta, Churchil confessou ao seu secretário:"Com exceção da Grécia, os Balcãs vão ficar nas mãos dos bolcheviques e não há nada que eu possa fazer para impedir isso.
Tal como não posso fazer bada quanto à Polónia..."

Desprezo mútuo
Estaline e Churchil desprezavam-se mutuamente.
"Pensa que nos esquecemos de que tipo de homem é Churchil?", perguntou um dia Estaline a um quadro do Partido Comunista jugoslavo.
"Nada dá mais prazer aos infleses do que prejudicar os seus aliados. Com Churchil, temos de estar em guarda, porque é capaz de nos meter no bolso por causa de um Kopeck. De certeza que te roubaria até ao último kopeck! O Roosevelt não é assim, só se daria a esse trabalho para ter lucros mais substanciais. Mas o Churchil, sim."

Churchil também não tinha papas na língua:"Há muito que a Rússia é um grande animal esfomeado", disse a Charles de Gaulle, então dirigente da França Livre.
"Hoje, é impossível impedi-lo de comer. Mas não iremos deixá-lo comer o rebanho todo. Tenho-me esforçado por moderar as exigências de Estaline. Porque, depois do repasto, vem a digestão. E quando esse momento chegar soará a hora das dificuldades para os russos. E então São Nicolau talvez possa ressuscitar as pobres crianças que o monstro tenha metido na salgadeira."

Em fevereiro de 1945, Winston Churchil e o Presidente dos Estados Unidos Franklin Roosevelt, deslocaram-se à Crimeia para se encontrarem com Estaline.
Emfalta, a harmonia é perfeita.
O Chefe do Estado-Maior adjunto do Exército Vermelho, general Antonov, pede aos Aliados que realizem uma operação aérea, para impedir que os alemães mandem freforços para a frente leste.
E indica-lhes três reais ou supostos centros logísticos: Berlim, Leipzig e Dresden.
Os Aliados assim fazem.
Na noite de 13 de fevereiro, depois de um bombardeamento ininterrupto, a contagem oficial de mortos na cidade [sem valor estratégico] foi de 40 mil.


CRONOLOGIA  
O DESTINO DA EUROPA
4 -11 de fevereiro de 1945
Conferência de Ialta, Roosevelt, Estaline e Churchil debatem o destino da Europa após a derrota do III Reich.
17 julho - 2 de agosto de 1945
Conferência de Potdsam.
Após o primeiro emsaio nuclear norte-americano, os Três Grandes resolvem a questão da ocupação da Alemanha
4 de abril de 1949
Instituição do Trtado do Atlântico Norte (NATO), que reúne nessa altura dez países ocidentais.
14 de maio de 1955
Instituição do Pacto de Varsóvia, aliança dos países do Bloco de Leste, após a entrada da Alemanha Ocidental na NATO
13 de agosto de 1961
Início da construção do Muro de Berlim.
Encerramento da fronteira entre Berlim ocidental e Berlim oriental.
1 de agosto de 1975
Assinatura dos Acordos de Hensínquia por 35 países, entre os quais a URSS e os Estados Unidos, com o objectivo de melhorar as relações entre os dois blocos.
10 de novembro de 1989
Queda do Muro de Berlim.
Desmantelamento progressivo da Cortina de Ferro, que separava a Europa Ocidental dos países do Leste.
8 de dezembro de 1991
Acordos de Belaveja (Tratado de Minsk).
A Rússia, a Ucrânia e a Bielorússia decidem dissolver a URSS.
12 de março de 1999
Hungria, a POlónia e a República Checa são os três primeiros países de Leste a entrar para a NATO.
2 - 4 de abril de 2008
Na cimeira da Nato, em Bucareste, as candidaturas da Ucrânia e da Geórgia, durante algum tempo consideradas aceitáveis, acabam por ser rejeitadas.


Reparações e repatriamentos
Estaline, Roosevelt e Churchil fixam a data em que a URSS entrará na guerra contra o Japão.
Concluem o plano de ocupação da Alemanha e estabelecem um compromisso quanto à questão das indemnizações de guerra.
Chegam a acordo acerca da reintituição da França como grande potência e relativamente à criação da ONU.
Os três assinam um documento sobre o repatriamento para a Rússia de todos os cidadãos soviéticos que se encontrem na zona anglo-americana, em especial doa apanhados com uniforme alemão.
Foi assim que os membros do exército de Vlassov, viriam a ser enforcados.
Os outros seriam enviados para os gulags ...

Foi em Ialta que Estaline, Churchile Roosevelt definiram a fronteira onde devia parar o avanço dos soviéticose dos Aliados.
Depois da guerra, essa linha de demarcação viria a dividir a Europa em duas.

Estaline queria que fossem reconhecidas internacionalmente as novas fronteiras da União Soviética, incluindo as repúblicas do Báltico, a Ucrânia Ocidental e a Bielorússia, a Polónia - anexada na sequência da partilha - e, ainda, a Bessarábia e a Bucovina, que tinham pwertencido à Roménia até 1940.
Em segundo lugar, Estaline tinha a intenção de rodear a União Soviética de uma cintura de países amigos.
Todos os países onde o Exército Vermelho entrara deveriam ser incluídos na esfera sde influêncis soviética.

Os dirigentes ocidentais reconheceramo papel desempenhado pela URSS no Leste europeu.
Franklin Roosevelt escreveu a Estaline: "Os Estados Unidos não apoiarão. de modo algum, um poder de transição na Polónia que vá contra os vossos interesses".

No início  de 1945, Roosevelt já sofria de uma isquémia cerebral, que o matava lentamente.
O seu coração doente já não conseguia fazer chegar o oxigénio ao cérebro.
Há quem diga que, na Conferência de Ialta, Roosevelt estava tão mal que não compreendia o que Estaline dizia.
Seria mais exatro dizer que o Presidente norte-americano não podia, por definição, deixar de compreender o dirigente soviético.

"Os norte-americanos sabem perfeitamente que a União Soviética tem interesses especiais nos pequenos países da Europa de Leste e que deve ocupar um lugar privilegiado", disse o embaixador norte-americano Harriman ao comissário do povo Molotov.
"Mas é preciso apresentar as coisas à opinião pública norte-americana de uma maneira que esta não pense que a Bulgária e a Roménia são 'esmagadas' pela URSS, que as eleições nesses dois países não são livres e que os governos são 'fantoches russos'."
Na Conferência de Ialta, oa participantes não se davam conta até que ponto mentiam uns aos outros e a si próprios
Americanos e britânicos não aceitaram que os países libertados pelo Exército Vermelho fossem reformados ao estilo soviético.
As três potências aprovaram uma declaração sobre a democratização dos Estados europeus.
Roosevelt pensava que seriam organizadas eleições livres.
Churchil já assimilara o princípio da diplomacia estaliniana: o que é nosso deve continuar a sê.lo, o resto será obtido pela negociação.

Em Moscovo, Washington e Londres, as visões dos "interesses particulares" eram diferentes e imperavam equívocos sobre as intenções de uns e de outros.
Para Estaline, o acordo era: ele não contruiria porta-aviões e manter-se-ia fora dasesferas de influência que Reino Unido e EUA tinham garantido para si.
Em contrapartida, o Ocidentenão meteria o nariz nos seus assuntos no Leste.
Quando foi a Moscovo [a 2 de dezembro de 1944], o futuro Presidente françês, Charles de Gaulle, concluiu da conversa com Estaline: "Os soviéticos estão decididosa tratar os Estados e territórios ocupados pelas suas tropas como muito bem entenderem".

Em Ialta, Estaline concluiu que os homólogos ocidentais eram hipócritas sem determinação e que era possível pressionar para obter ganhos.
Oa participantes não se davam conta até que ponto mentiam uns aos outros e a si próprios.
Mesmo que Ialta não se tivesse realizado, a Europa ficaria dividida.~
Dirigindo-se aos camaradas do partido, Estaline disse: "Esta guerra é diferente da anterior.
Quemk ocupar um território faz entrar nele, depois do seu Exército, o seu modelo de sociedade.
Não pode ser de outro modo".






OS APETITES DO REVANCHISMO RUSSO
Visto de Kiev, o objectivo de Moscovo é redesenhar as fronteiras da Europa para reconstituir o seu império.
Por isso, qualquer tentativa de conciliação está destinada ao fracasso e pode sair cara.
Jornal UHRAINSKY Tijden - Kiev
Autor: Oleksandr Kramar - 07.02.2015
Tradutora: Fernanda Barão

Como antes da II Guerra Mundial, oa partidários ocidentais da "conciliação" com o agressor esperam em vão que Putin se contente com a Crimeia e com Donbass (leste da Ucrânia), ou com a absorção e a transformação de uma parte do território ucraniano em zona tampão.

Quando regressou ao poder, Putin esforçou-se por restabelecer a Rússia como centro de poder mundial, dotado de uma esfera de influência igual à que conheceu na juventude, na época soviética.
Ainda que a Federação Russa não disponha de recursos para voltar a ser uma superpotência, as ambições revanchistas do Kremlin não deixam de representar uma ameaça à Europa e ao Ocidente.
Se Putin não for travado na Ucrânia, a prazo, o Ocidente terá de, contra ventos e marés, assumir essa responsabilidade, porque a lógica da vingança é universal: os seus adeptos só param quando é tarde demais.

A Federação Russa de Putin sonha impor a sua hegemonia à Europa, afastando os EUA e minando a NATO e a solidariedade transatLãntica.
A ideia de uma zona de comércio livre "de Lisboa a Vladivostok" não passa de um instrumento para atingir essa meta.
A vertente económica desse projecto não passa de uma cortina de fumo.
Trata-se de um meio para concretizar objectivos geopolíticos - o que distingue a Rússia dos outros países europeus, onde a política é tributária da actividade económica.

Os partidos comunistas, que eram os antigos agentes de influência do Kremlin, foram substituídos por novos "aliados": forças políticas que rejeitam a democracia, o biberalismo e a globalização.
Em alguns países da UE poder+a verificar-se uma ascensão de forças pró-russas e antieuropeias, como aconteceu recentemente na Grécia.
Os projectos políticos do Kremlin beneficiam de apoio considerável em França.
Moscovo pode também contar com os aliados solidariamente implantados em Itália, na Hungria, na República Checa, na Eslováquia e na Áustria.
Para já não falar da Sérvia, que ainda não aderiu à UE.
Devido à sua tradicional hostilidade à UE, o Reino Unido poderá desempenhar um papel importante na desagregação desta última.
Se Putin não for travado na Ucrânia, a prazo, o Ocidente terá de, contra ventos e marés, assumir essa responsabilidade
A possibilidade de o Kremlin provocar a queda da UE, suscitando uma reorientação de parte dos seus actuais membros, não é tão delirante como parece.
A Ucrânia não é um caso isolado.
A própria Bielorússia começa a mostrar-se desconfiada do seu vizinho.
A 1 de fevereiro, entraram em vigor novas regras de proclamação da lei marcial.
É o caso da concentração de tropas de outro Estado nas suas fronteiras; da mobilização de um país limítrofe para atacar a Bielorússia; e do "envio de grupos armados irregulares ou não por outro Estado" para território nacional.
O objectivo é evitar cenários como a Crimeia ou Donbass.
Minsk receia uma Anschluss [anexação] versão Putin.

Na UE e na NATO, a primeira vítima de agressão poderia ser a Letónia, onde vive a maior percentagem de russófonos de todos os Estados-membros (mais de um terço dos habitantes).
No recenseamento de 2000, 55,1% dos naturais de Riga disseram ser russos.
Em alguns distritos próximos da fronteira chega-se aos 4o ou 80%.
Há pouco tempo, o porta-voz do Ministério russo dos Negócios Estrangeiros, Alexander Lukachevitch, voltou a acusar as autoridades letãs de "discriminação, em especial contra a população russófona".

Por definição, nem concessões nem manifestações de lealdade bastam para acalmar os apetites revanchistas.
A Rússia de Putin considera que a atual política ocidental é um incitamento às suas ações, porque alguns círcilos, no Ocidente, sentiriam uma certa "culpa" devido à "humilhação excessiva" xde que a Rússia foi vítima após o fim da Guerra Fria.

Só a destruição final do império e a transformação da Rússia num Estado-Nação como os outros poderão dissipar os complexos imperiais e a dor residual que as elites e parte da sociedade russa sentem desde a queda da União Soviética.
Só então a Rússia iniciará verdadeiramente a sua evoluçãopara a democracia e para uma normalização irreversível das suas relações com o Ocidente.




ENTREVISTA
"O OCIDENTE NÃO COMPREENDE PUTIN"
A historiadora britânica Fiona Hill, especialista em temas europeus e russos, aponta as incapacidades do Ocidente para compeender o chefe do Kremlin.
Der Spiegel HOLGAR STARK (excertos) - Hamburgo
Autora: Fiona Hill

No seu livro Mr. Putin: Operative in the Kremlin, descreve Vladimir Putin como um homem dotado de uma personalidade multifacetada.
Que impressão terão deixado nele o desaparecimento da União Soviética e o caos que, em seguida, se viveu no país?
Putin ficou profundamente marcado por esses axontecimentos.
Chegou ao poder em finais de 1999, quando o país estava a afundar-se, depois de dez anos de descalabro político e económico.
Ele é apologista de um Estado forte, como acontecia com o general De Gaulle, quando foi Presidente da França.
No discurso de tomada de posse, em dezembro de 1999, Putin comprometeu-se a proteger e restaurar o Estado, o que tocou a sensibilidade de uma parte dos russos.

Nesse sentido, falava repetidamente de solidariedade e de patriotismo.
Poderá dizer-se que os países ocidentais não conseguem compreender que a democracia não é o único valor que conta na Rússia de Putin?
Esse "discurso do milénio" era uma mensagem para o povo russo, em especial para as elites.
Ele expunha a "ideia russa" sobre a qual tencionava assentar a sua presidência.
A "Mãe Rússia" é mais importante do que qualquer indivíduo.
Este deve estar ao serviço do Estado, cujo papel é preponderante.
Na Rússia, as pessoas compreendem o que ele queria dizer.
Infelizmente, isso não aconteceu nos países ocidentais.

Que espera Putin dos ocidentais?
Toa a estratégia de Putin tem por objectivo fazer-se respeitar - do modo como ele o entende.
Do seu ponto de vista, o respeito quer também dizer que ninguém deve interferir nos problemas dos outros, exatamente o contrário daquilo que o Ocidente fez na Ucrânia.

Apresenta Putin como um apaixonado pela História e um grande leitor.
Em que medida isto influencia a sua política?
Ele aplica ensinamentos retirados da História da Rússia ao presente.
Isso é visível, em especial na crise ucraniana.
Evoca memória da II Guerra Mundial e acusa a Ucrânia de ser um cadinho do nazismo e de todos os flagelos do passado.
Daí a ideia de que, hoje, Putin está a travar uma nova guerra de libertação contra os extremistas.
É um grande admirador de Piotr Stolypin, primeiro.ministro do último czar da Rússia, que tentou levar a cabo um grande programa de reformas para salvar o império.
Putin vê uma continuidade entre o Império russo e a Rússia dos nossos dias, passando pela União Soviética.

Ele fala da sua juventude em Leninegrado [São Petersburgo] com um período simultâneamente duro e essencial ...
A sua família passou fome, em Leninegrado, um irmão morreu durante a guerra.
Putin apresenta-nos a imagem de uma criança que nunca teve medo dos confrontos e que precisou de se impor, na rua, pela força dos punhos.
Começou a praticar boxe com 10 ou 11 anos, antes de se iniciar no judo.
Dessa época, retirou uma máxima que resume do seguinte modo:"Quem queira ganhar, luta sempre como se travasse o último combate, o combate decisivo".
Foi, aliás, esta aimagem que nos m ostrou, durante a segunda guerra da Tchechénia, e é assim que se comporta na Ucrânia.
A sua mensagem é que é preciso fazer tudo o que for necessário para  chegar à vitória.

No primeiro mandato, estendeu visivelmente a mão em direção aos Estados Unidos.
Porque terá mudado de atitude?
Após o 11 de Setembro, Putin tentou uma aproximação a Washington, mas os norte-americanos forçaram um alargamento da NATO, o que alimentou a ideia de que os EUA e a Europa recusavam a sua mão estendida e os seus esforços para construir novas relações com, o Ocidente.
Disse explicitamente, na Conferência de Munique sobre segurança, de 2007, que considerava o Ocidente uma ameaça para a Rússia.
Nessa altura, ninguém o levou a sério.

Acha que os ocidentais ignoram outros sinais do mesmo género?
Na cimeira da NATO em Bucareste, em 2008, Putin explicou ao seu homólogo norte-americano, George W. Bush, que não considerava que a Ucrânia fosse um Estado soberano e autónomo.
Para ele, era evidente que não poderia haver negociações [com a Ucrânia] sem a Rússia.
Em parte não quisemos aceitar isto e em parte não percebemos a sua posição.

Será que a União Europeia fez mal ao propor um acordo de associação à Ucrânia?
Não acho que tenha sido um erro negociar um acordo, mas era possível gerir muito melhor o processo.
Na primavera de 2013, era óbvio que estávamos a caminha de grandes problemas com a Rússia.






MERKEL: A MESTRA DO JOGO EUROPEU
No dossiê Ucrânia, a chancheler alemã gtem desempenhado um papel-chave por gozar simultaneamente da confiança de Obama e de Putin.
Até quando?
JORNAL  DIE WELT - Berlim
Autor: Robin Alexander (excertos) - 15.02.2015
Tradutora: Fernanda Barão

Raras vezes uma semana terá sido tão marcada por um dirigente político como a segunda semana de fevereiro.
Sustentando a respiração, num estado de semifascínio, a opinião pública acompanhou a ação da chancheler na cena internacional.
Algo que nunca tinha contecido desde a sua tomada de posse, faz em novembro dez anos, e raramente aconteceu antes dela.
Numa semana, Angela Merkel percorreu mais de 20 mil quilómetros para se reunir com Barack Obama, Vladomir Putin e com os homólogos françês e ucraniano, François Hollande e Petro Poroshenko, concliuindo a semana com uma cimeira europeia com todos os chefes de Estado e de Governo do continente.

Perguntar-se-á: como é que ela consegue?
Por outro lado, já se deixaram de fazer perguntas sobre uma realidade ainda mais espantosa do que a disciplina que uma mulher política impõe a si própria: ainda há pouco tempo, a Alemanha desenhava as advertências, como a do Presidente Joaqchim Gauck, e recusava-se a reconhecer que a sua ascensão como potênciaa compelia a desempenhar um papel mais ativo na cena internacional.

Hoje,a ambição de dirigir a Europa é evidente e personifica-se em Angela Merkel.
Quando vai encontrar-se com Putin, juntamente com o Presidente françês, sabe-se qual dos dois vai a acompanhar o outro.
A conhecida piada do antigo secretário de estado norte-americano, Henry Kissinger, que lamentava não poder telefonar à Europa porque não sabia o número do telefone, já tem resposta: o número da Europa começa com o indicativo de Berlim.
Depois de, na crise do euro, ter assumido a liderança em matéria de política económica, temos agora Angela Merkel a assumir a liderança política sobre o essencial: a questão da guerra ou da paz.

Contra os EUA, a favor da Rússia
O laço especial que a une aos Estados Unidos continua, porém, a ser pouco visível.
Acontece que Angela Merkel é uma atlantista convicta, que j+a teve de juntar os casos após a recusa categórica de Gerhard Schroeder [ex-chancheler social-democrata] e do [seu ministro dos Negócios Estrangeiros (Verdes)] Joschka Fischer de participar na guerra do Iraque ao lado dos EUA.

Contudo, ao longo dos seus mandatos, opôs-se por duas vezes aos Estados Unidos e tomou posição a avor da Rússia.
A primeira foi sobre uma questão essencial para o vasto império do leste: foi Merkel que, em 2008, impediu a integração da Ucrânia e da Geórgia na NATO, desejada por George W. Bush.
Putin terá declarado, na altura, que ficaria eternamente grato à chancheler.
Em 2011, a Açemanha de Merkel voltou a demarcar-se dos seus aliados.
Foram os EUA e também, esobretudo, o Reino Unido e a França que derrubaram o ditador Muammar Kadhafi.
A Rússia, que permitiria ao Conselho de Segurança o estabelecimento de uma zona de exclusão aérea mas não queria a queda do regime, sentiu que tinha sido enganado.
A Alemanha ficara de fora.
Na relação privilegiada que Merkel e Putin mantêm, estes gestos contam, pelo menos tnto como a frequentemente evocada experiência comum de ambos terem vivido do "lado sombrio" da Corrina de Ferro.
Se há no Ocidente um responsável político com quem Putin pôde constuir uma relação de confiança é Angela Merkel
Aliança com Washington
Se há no Ocidente um responsável político com quem Putin pôde construir uma relação de confiança, é Angela Merkel.
A cooperação cada vez amis estreita da economia alemã com os fornecedores de matérias-primas russos deveria ter levado essa relação muito mais longe.
Mas tal ligação privilegiada não semeou a divisão entre os EUA e a Alemanha, relativamente à questão ucraniana.
Pelo contrário, quanto ao dossiê russo.
Obama deixou Merkel usar uma maaargem de manobra de que ele não dispunha.
Do outro lado do Atlântico, os detratores de Obama acusam-no de se esconder atrás de Merkel.
Por seu lado, ela não tenta chamar a si os louros e procura consolidar a aliança com Washington.
Não foi por acaso que começou a semana decisiva de fevereiro na capital norte-americana.

Merkel declarou que a convergência entre alemães e norte-americanos sobre a questão russa não seria posta em causa, se - contra a sua opinião - os EUA fornecessem armas à Ucrânia.
Portanto, Putin não atingiu o seu objectivo de dividir o Ocidente.

A chacheler desempenha um papel diferente do dos seus antecessores.
Contudo, por mais engenhosa que seja, a arte da política pode sempre falhar por causa da parte contrária.
Na Ucrânia, quem hoje decide é Putin, e só ele.
Que se passará se o Presidente não desarmar os seus homens, no leste da Ucrânia?
Se for evitada uma guerra na Europa, o conflito ucraniano irá consolidar, tal como o salvamento do euro, a imagem da chancheler.
  





NATO FALA MAS NÃO FAZ 
A Aliança Atlântica perde-se em discussões intermináveis sobre a Ucrânia e não reage, em termos práticos, às manobras de Putin
JORNAL   THE GUARDIAN  - Londres
Autor: Ian Tranor (excertos) - 05.02.2015
Tradutora: Fernanda Barão


A democracia é complicada.
E, quando se trata de coligações e forúns internacionais como a NATO ou a União Europeia, à complicação junta-se a burocracia.
Comissões e grupos de trabalho, cimeiras e consensos, conflitos e compromissos.
Parece um exército de sherpas (montanheses do Nepal) a trepar penosamente montanhas políticas numa tentativa de alcançar o topo: um acordo.
A democracia internacional não se presta a ações rápidas, firmes e eficazes.

Para os ditadores e os regimes autoritários, tudo é mais simples.
Liga-se um interruptor, puxa-se uma alavanca e as coisas acontecem, em muitos casos instantaneamente.
É esta uma das razões pelas quais a disputa sobre a Ucrânia entre Putin e a Europa é tão desequilibrada.
Equanto um age, a outra esforça-sepor reagir.
O lado oriental tem estado sempre um passo à frente - pelo menos a curto prazo.

Seis meses depois de o Kremlin ter apanhado a Europa de surpresa, ao apoderar-se de uma região da Ucrânia [a Crimeia], a cimeira da NATO no País de Gales [a 4 e 5 de setembro de 2014] revelou as ideias da Aliança para reforçar a segurança na Europa de Leste.
Há mais de duas décadas que a NATO vem sendo assolada por dúvidas sonbre si mesma.
A Guerra Fria tinha sido ganha, para quê continuar?
Putin deu um novo impulso aos estrategas militares de Mons e aos exércitos de burocratas de Bruxelas.
O objectivo principal da NATO - fazer frente à Rússia e travá-la - voltou a ter legitimidade.

A cimeira de Newport decidiu criar uma força expedicionária com a dimensão de uma brigada, ou seja, mais de cinco mil homens, capaz de se deslocar rapidamente para a Polónia ou para os Estados Bálticos: pequenas unidades de forças especiais em algumas horas, reforços mais significativos em alguns dias, aos primeiros sinais de perigo.

Quem paga? Quem assume o comando?
Isso foi há seis meses.
Contudo, dede a cimeira, o plano foi definhando, atolado em discussões intermináveis sobre quem faz o quê, quando e onde.
Quem paga?
De onde vem o material?
Os norte-americanos virão render os europeus?
Quem assume o comando?
Os ministros dos Negócios Estrangeiros da NATO reuniram-se em Bruxelas, em dezembro, numa tentativade materializaressas intenções.
Alguns embaixadores europeus queixam-se de que se avançava a passo de caracol.
Depois disso, pouca coisa mudou.

Segundo alguns altos funcionários, essa força operacional não seria mobilizável antes de 2017 - um prazo demasiado longo, num momento em que se trava uma pr«equena guerra oriental da NATO.

Há 30 anos, convencida de que o confronto Leste/Oesteacabra definitivamente, a NATO renunciouaos complexos e sofisticados mecanismos de planeamento que, durante a Guerra Fria, lhe permitiam reagir instantaneamente na Europa.
É difícilb ressuscitá-los
Convencida de que o confronto com o Leste acabara, a NATO renunciou ao paleamento.E fez mal
Desde então, as infraestruturas logisticas e técnicas degradaram-se.
Deslocar rapidamente armamento pesado e tanques do meio da Europa para as fronteiras russas no Báltico, por exemplo, é problemático, pela simples razão de que a rede ferroviária da Alemanha já não tem a bitola adequada.

Guerra de comunicação
Esta reação indulgente, sem convicção e burocrática perante a brutalidade do Kremlin, é acompanhada, no Ocidente, por uma falsa surpresa por os russos não cumprirem as regras do jogo e se terem lançado numa nova e temível forma de "guerra híbrida", que requer um certo tempo de adaptação:propaganda na TV, seguida de catadupas de desmentidos, recurso a gripod paramilitares e a tropas especiais sem uniforme, financiamento, armamento e equipamentos de mercenários que agem por conta própria, negação plausível de envolvimento, diálogo e suborno de cavalos de Troia políticos no campo inimigo, ou seja, na Europa.

Qual a resposta a isto?
Grandes reflexões sobre a "comunicação estratégica".
A NATO criou uma uniodade especial encarregada de pensar numa resposta em termos de comunicação.
Na UE, há planos letões e planos estonianos; os governos britânicos e dinamarquês mandaram cartas à Comissão Europeia.
Os holandeses disponibilizaram maio milhão de euros para financiar um projecto.

Frederica Mogherini, alta representante da UE para os Negócios Estrangeiros, foi encarregada de pensar os meios de combater a propaganda russa.
"Estão sempre a mentir, a distorcer os factos.
É um nojo.
A propaganda é morlmente repreensível e raras vezes eficaz", declara um responsável letão, envolvido em projectos de comunicação social.
E acrescentou: "Toda a gente está de acordo sobre a necessidade de fazer qualquer coisa.
Mas o quê?
É uma discussão que continua em curso.

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